Nicole Arbour em vídeo gordofóbio: a ignorância também deveria ser combatida
Novidade para você: passar a mão na cabeça de um humorista preconceituoso é tão doentio quanto qualquer outra patologia.
Essa semana um vídeo de “humor” explodiu na rede mundial, a apresentadora chama-se Nicole Arbour e se acha muito engraçada fazendo piada de gordo. Opa, piada não! Segundo ela o objetivo do vídeo é como ser uma amiga dando conselhos, para que os gordos finalmente se toquem que são gordos – já que nada nem ninguém fica jogando isso na cara deles 24 horas por dia, não é?! – e apenas emagreçam, cuidem da sua saúde para aí sim terem orgulho de seus corpos. Fácil, né, Nicole? Porque afinal nenhum gordo nunca se tocou como é difícil ser julgado constantemente, nem sofreu para achar roupas, tampouco foi reduzido inúmeras vezes a apenas seu peso… Não! Isso é tudo mimimi e o gordo só está nessa situação, porque optou por ocupar esse lugar na sociedade, não é Nicole?
Aliás, o gordo ADORA que todo mundo se sinta no direito de se meter na sua saúde, adora que as pessoas ignorem completamente qualquer outra qualidade dele apenas em favor da sua aparência, o gordo VAI AO DELÍRIO quando presumem que ele é preguiçoso, devagar e sem força de vontade e é praticamente um ORGASMO quando alguém lhe avisa que ele precisa emagrecer. Porque afinal, vida de gordo gira sempre em torno apenas de sua gordura. Por favor, adicione o tom irônico. Mas é claro, a Nicole não tem como saber disso porque é magra e provavelmente não passou por essas situações.
Ok, vamos entrar no jogo e fingir que todo gordo é realmente doente (eu estou fora dessa partida porque sou gorda e saudável… E olha só, caramba, já fui excluída de novo do padrão). Será que a Nicole iria ao Hospital do Coração e ficaria passando na porta dos quartos berrando para os doentes o quanto eles merecem estar ali porque não se cuidaram a vida inteira, mas está tudo bem e existe esperança, afinal é só colocar uma ponte de safena e parar de comer frituras que as pessoas saudáveis lhe dão permissão para se amar? Ou será que ela iria no centro de tratamento da AIDS e passaria falando como os pacientes merecem estar ali porque transaram sem camisinha, mas que tudo bem porque é só tomar os coquetéis de pílulas para controlar o vírus e aí as outras pessoas lhe darão permissão para ser feliz?
Bom, se ela fizesse isso, eu seria praticamente obrigada a gravar um vídeo sabe, como amiga, explicando que isso não ajuda ninguém, não salva ninguém e nem todo mundo está lá pelos mesmos motivos e fatores. Isso é somente ser uma verdadeira idiota e a última coisa que uma pessoa em uma situação difícil precisa é da opinião insensível de uma pessoa ignorante que não sabe como é passar pelo mesmo problema.
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O verdadeiro problema da Nicole, na verdade, é com o movimento de aceitação da diversidade de corpos e, com isso, pessoas gordas se amando. A ideia tanto para a apresentadora quanto para as mais de 156 mil pessoas que compartilharam seu vídeo parece horrível, porque elas passaram sua vida inteira lutando contra gorduras de todas as formas possíveis. Tudo que lhes falam na televisão, nas revistas, nos filmes lhes levou a acreditar que o grande vilão da sociedade é a gordura e que, mesmo que a gordura não interfira na saúde física de uma pessoa, ela TEM que interferir na saúde mental. Novidades para vocês: um dos grandes vilões da sociedade – e muito pior do que a gordura – é o preconceito e essa mania horrorosa de achar que você tem direito sobre qualquer outro corpo que não seja o seu.
Tentar encaixar todo mundo dentro de um padrão é uma lógica capitalista maldosa, cujo único objetivo é render muito dinheiro para as academias, marcas de shakes, indústria têxtil, entre muitos outros segmentos, sem contar o poder de manter as mulheres sob rédeas, a custo da infelicidade e massacre da autoestima das pessoas. Um preço baixo para manter a economia rodando, não é Nicole? Então, as pessoas ignorantes, continuam replicando esse discurso de ódio contra gordos em um ciclo irracional de ofensas, com a desculpa de “apenas querer ajudar”.
Vem cá, queridinha, já que você quer tanto ajudar, pegue o dinheirinho que você ganhou de anúncios com esse seu vídeo raso e preconceituoso e doe para uma instituição que dê apoio psicológico para as pessoas que realmente querem emagrecer. Quanto às outras, as que já amam seus corpos como são, deixe-as em paz, ninguém é obrigado a se encaixar no seu padrão e ninguém é obrigado a ser infeliz só porque outras pessoas não conseguem enxergar seus corpos de outra maneira.
Ah! Só mais uma coisa: sou gorda, não como fritura, nem salsicha…. Você é loira e tenho certeza que você não é burra… Minha amiga magra odeia academias… Meu amigo gay é perfeitamente equilibrado… Viu só como é difícil colocar todo mundo que tem apenas uma característica em comum dentro da mesma caixinha? Compartilhar um vídeo com esse discurso de ódio é tão ignorante quanto gravá-lo. E acima disso, é irresponsável, porque o gordo já sofre preconceitos diariamente e ainda tem que lidar com uma autointitulada humorista que reforça isso. Uma novidade para você, Nicole: você não está sendo inovadora, engraçada ou fazendo um bem para a sociedade, só está sendo preconceituosa e mesquinha mesmo.
Querida Nicole, se por um lado você acha que usar hashtags de incentivo ao amor próprio e uma visão positiva sobre o corpo é um jeito de passar a mão na cabeça do gordo-doente e isso só faz mal para a vida de 1 indivíduo, por outro eu digo que compartilhar vídeos ignorantes como o seu é passar a mão na cabeça do preconceito, que prejudica a vida social como um todo. Pense bem, qual é pior e qual REALMENTE afeta a sua vida? #fikdik e #maisamorporfavor