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Ela teve o corpo incendiado pelo ex-namorado e conta sua história

Depois de ter 47% do corpo queimado pelo homem que amava, Bárbara Hoelscher busca alertar outras mulheres: "Não acredite quando ele diz que vai mudar".

Por Júlia Warken
Atualizado em 20 jan 2020, 13h07 - Publicado em 31 Maio 2017, 19h35

Assim como tantas outras mulheres, Bárbara Hoelscher, de 25 anos, já havia sido agredida mais de uma vez pelo namorado. Mesmo assim, jamais poderia imaginar o terrível pesadelo que iria viver no dia 10 de novembro de 2016. 

Ela e o então companheiro, Igor Rafael Schönberger, moravam juntos há alguns meses, em Lindolfo Collor, uma pequena cidade do Rio Grande do Sul. Em meio a uma discussão boba, Bárbara e Igor iniciaram uma briga feia e, de repente, Igor começou a jogar produtos químicos na namorada. “Ele começou a me agredir e, primeiramente, tocou inseticida. Aí mandou eu ficar quieta e jogou Alvex [água sanitária], depois pegou o álcool”, relembra Bárbara.

Desnorteada, ao ver a garrafa de álcool já aberta na mão do namorado, ela sacudiu a embalagem e gritou “O que tu vai fazer agora? Vai me matar?”. Logo em seguida, Igor riscou um fósforo e Bárbara começou a pegar fogo. Com o corpo molhado de produtos químicos, as chamas se espalharam rapidamente e correr para o banheiro foi inútil.

Naquele momento, a única preocupação de Igor era o medo de ser preso

Embaixo do chuveiro, o homem ajudou a namorada a apagar o fogo e tirar a camisola, aparentemente arrependido. “Mas eu tive que insistir muito para que ele me levasse ao hospital. Quando eu desliguei o chuveiro e ele viu que eu estava toda queimada, ele disse ‘meu Deus, tu tá horrível’. Aí foi em direção à cozinha, pegou uma faca e disse que ia se matar”.

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Nesse momento, mesmo com metade do corpo coberto por queimaduras, Bárbara teve que manter a serenidade para acalmar o namorado e afastar a faca. “Eu pedi ‘pelo amor de Deus, me leva para o hospital’ e ele só repetia ‘Não, porque eu vou ser preso'”.

Por fim, o homem se convenceu de que deveria levá-la ao pronto-socorro, que ficava em outra cidade. “No caminho inteiro, eu estava muito assustada. Ele só repetia ‘eu vou ser preso, vou ser preso’, dando socos na direção. Em nenhum momento se preocupou comigo. Mas a estrada tem muitas curvas e eu fiquei com medo de que ele fosse virar o carro, por isso, tentava acalmá-lo”.

Como é de praxe quando um paciente naquele estado dá entrada no hospital, a polícia foi chamada. Antes disso, uma enfermeira perguntou aos dois o que havia acontecido. “Ele respondeu que tinha sido eu [a culpada pela combustão]. Ouvir aquilo me destruiu por dentro. Mesmo me vendo naquele estado, ele me culpou”.

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Violência doméstica

Negligência policial agravou ainda mais a dor

Não bastasse a dor física e emocional, Bárbara também se viu vítima da negligência por parte da polícia. Ela conta que, na noite do ocorrido, o policial que a atendeu se limitou a perguntar se ela queria representar contra Igor. Atordoada, a moça não compreendeu o termo e respondeu negativamente. Com base nisso e no depoimento de Igor (que negou a culpa), a polícia lavou as mãos. “Não fizeram perícia nem nada na nossa casa”, relata.

Assim que a família se deu conta de que o caso não estava sendo investigado, prestaram queixa. Dois dias depois do crime, quando a polícia foi realizar a perícia, a residência do casal já estava completamente limpa – e até hoje Bárbara não sabe quem fez a faxina. Felizmente, o irmão da moça havia ido ao local um dia antes e registrou tudo. Oito dias depois do crime, o mandado de prisão foi finalmente liberado, mas Igor já havia fugido há muito tempo.

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Meses mais tarde, Bárbara teve a sorte de receber uma denúncia anônima por telefone. A pessoa lhe informou que Igor estava vivendo na chácara de um tio, em Imigrante – uma minúscula cidade com apenas 3 mil habitantes. Ao contatar a delegacia da região, a resposta foi que sem um endereço completo as buscas não poderiam ser feitas. Somente quando a advogada da vítima acionou o Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC), é que a polícia resolveu tomar alguma providência.

No final de fevereiro, três meses e meio depois de ter ateado fogo à namorada, Igor finalmente foi apreendido. Hoje, ele está no Presídio Central de Porto Alegre, aguardando o julgamento. 

A vida por um fio

Somado a todo o trauma, mais um drama: a família queria que Bárbara fosse transferida do precário Hospital Municipal de Novo Hamburgo (a 42 quilômetros de Porto Alegre) para uma unidade especializada em queimados na Capital. Os médicos alegaram que ela poderia morrer no trajeto. Com isso, a transferência não ocorreu e a paciente ficou 73 dias internada e isolada, sem receber tratamento adequado.

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Ela teve 47% do corpo queimado e seu estado era muito grave. Depois de quase dois meses e meio de internação, Bárbara recebeu alta, pois uma bactéria perigosa estava se espalhando pela UTI do hospital e, com a carne exposta e a imunidade baixa, contraí-la poderia ser fatal.

“Aí os meus pais, com a ajuda de amigos, montaram uma mini UTI para mim no meu quarto. Também precisamos contratar uma enfermeira para fazer a raspagem”. As despesas altas foram se somando e a família teve que recorrer a uma vaquinha virtual e à venda de rifas. “Gostaria de poder agradecer, um a um, a todas as pessoas que me ajudaram. E se não fosse a mobilização dos meus amigos, junto com minha família, eu não sei onde estaria agora”.

Ainda hoje, Bárbara requer acompanhamento. Ela já passou por duas cirurgias e seis enxertos, mas agora aguarda a cicatrização total para iniciar os procedimentos estéticos.

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Sem nunca deixar de sorrir, Bárbara posta sua recuperação nas redes sociais: “Agradeço por estar viva” (Bárbara Hoelscher/Acervo pessoal)

Um alerta urgente a outras vítimas

Falar sobre um episódio tão traumático é tudo, menos fácil. Mesmo assim, Bárbara não hesitou em dividir sua história com a gente. Isso porque essa guerreira sente que é necessário alertar outras vítimas de violência doméstica.

“Eu amava muito ele e achava que ia conseguir mudá-lo. Eu achava que ia conseguir fazer com que ele deixasse de ser agressivo”, diz ela, sobre o fato de não ter denunciado Igor, mesmo depois de ser agredida mais de uma vez. E Bárbara sabe que inúmeras mulheres estão vivendo a mesma situação nesse exato momento. Muitas delas a procuraram pelas redes sociais, depois que as notícias sobre o caso se espalharam.

“Agora eu digo: não aceite nem mesmo um tom de voz mais alto, porque nesse momento o homem já perde um pouco do respeito. Isso pode levar à primeira agressão, que gera a segunda e a terceira. E assim vai ser pelo resto da vida, se ninguém tomar uma atitude. Não acredite quando ele diz que vai mudar, porque não muda. Das mulheres que me procuraram, sem exceção, nenhuma disse que apanhou apenas uma vez”.

Se você souber de algum caso de agressão, denuncie

Qualquer pessoa pode fazer uma denúncia, inclusive anônima, quando fica sabendo de casos de violência doméstica. É possível ligar para o 180, para a delegacia mais próxima (de preferência, a de Defesa da Mulher, se houver uma na sua cidade) ou diretamente para a Promotoria de Justiça.

“Independente se for amigo ou não, denuncie. Uma vez eu contei ao meu melhor amigo [que tinha sido agredida] e, quando tudo aconteceu, ele se sentiu super culpado por não ter tomado uma providência na época em que soube que eu apanhei. Sempre denuncie quando souber de uma agressão, pois essa pessoa pode acabar como eu. E eu ainda estou viva, agradeço todos os dias por isso, mas têm muitas que morrem“.

Outra coisa importante é nunca julgar as vítimas que não denunciam seu agressor. Essas mulheres precisam de solidariedade e cada história envolve graus diferentes de complexidade. No caso de Bárbara, ela acreditou nas promessas de que Igor iria mudar. “Muitas sofrem ameaças e têm medo de denunciar. Só quem sofre agressão sabe o que é passar por isso. Ninguém pode apontar o dedo e nenhuma mulher gosta de apanhar”, finaliza.

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