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“Você já se sabotou hoje?”

Executivo que virou empreendedor lança livro sobre estresse e depressão no trabalho e na vida

Por Liliane Prata
Atualizado em 22 out 2016, 20h13 - Publicado em 13 nov 2015, 14h01

Ansiedade Corporativa é o título do segundo volume da série O executivo Sincero (Rocco), do ex-executivo e atual empresário bem-sucedido Adriano Silva. O autor, que hoje é sócio de duas empresas de comunicação e dá palestras sobre vida corporativa, empreendedorismo e revolução digital, desenvolveu um olhar aguçado sobre os desafios e percalços da rotina de qualquer profissional. “O mundo do trabalho, seja você um executivo ou empreendedor, é um palco de glórias e desastres, de conquistas e tragédias, de alegrias e frustrações”, escreve na sua nova obra. “É ali que nos definimos – e somos definidos.” No primeiro volume, Adriano se focou nos altos e baixos do dia a dia dos engravatados. No terceiro, ainda inédito, falará aos que, como ele, substituíram o crachá pelo próprio negócio. Este segundo volume, que acaba de chegar às livrarias, é o mais amplo da trilogia – em relatos biográficos e reflexivos, todos em um tom bem pessoal e, fazendo jus ao nome da série, sincero, Adriano escreve sobre estresse, ansiedade e depressão. A seguir, o autor fala sobre a obra.

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Por que escrever um livro sobre tristeza e ansiedade?
Percebi que boa parte das reflexões que eu tinha feito ao longo da carreira passava pelo impacto emocional que o trabalho tem na gente: competição, demissão, expectativas dos outros e as nossas próprias, frustrações, sonhos. Gastamos doze, catorze horas por dia trabalhando, e essa parte do dia não consiste apenas em produzir mais, mas tem um aspecto emocional muito forte envolvido. É comum os executivos passarem uma imagem de cavaleiro solitário, pessoas que resolvem tudo, são quase sobrenaturais. Mas não são: são pessoas que precisam lidar com uma carga enorme de ansiedade e estresse que, não raro, terminam em depressão. Esse público, seja executivo, seja empreendedor, consome ainda mais medicamentos tarja preta do que a média nacional. Enfim, percebi o tanto de solavancos que eu vivia no trabalho, de conquistas marcantes a uma demissão que mexeu comigo, e quis escrever sobre isso: sobre como, nesse processo, fui aprendendo a lidar com minha tristeza, minha ansiedade. Minha proposta com esse livro é botar o dedo na minha própria ferida e, ao expor minha individualidade, me conectar com a individualidade do outro.

Você fala da sedução da melancolia, da tristeza como um vício. Para você, ser feliz passa por uma escolha?
Sim. Em minha autoanálise, sou um cara que tem uma tendência introspectiva. Uma série de fatores me transformou num sujeito não exatamente ensolarado. Desde cedo percebi isso. Tristeza, ansiedade e mesmo a nostalgia, que enxergo como um tipo de melancolia: isso faz parte do humano. A questão é ter a quantidade desse tipo de emoção dentro de um limite que não nos faça infelizes. Se a gente não se cuida, a gente derrapa mesmo. Cada um encontra seus próprios caminhos para se sentir bem. No meu caso, é racionalizando tudo isso. Tem pessoas que buscam isso na meditação, na ioga. Outras, nas drogas.

No livro você faz críticas duras aos psiquiatras.
Eles distribuem pílulas da felicidade de maneira irresponsável hoje. O remédio não muda o jeito de você viver: se você não resolve, não vai sair dali. O doping, às vezes, pode te fragilizar ainda mais. O excesso de remédios prescritos garante lucros à indústria farmacêutica. Acho que cada um tem que encontrar seus mecanismos de viver melhor, com mais equilíbrio. Se você é ansioso, tem que aprender, do seu jeito, a lidar com as coisas e com a imprevisibilidade das coisas. Não faço uma crítica moral a quem usa medicamento. Mas, quando analiso essa economia toda que existe por trás dos antidepressivos, vejo essa indústria com ceticismo.

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Você acha que as pessoas se sabotam?
Sim. A melancolia é uma droga doce. É sedutora. Na autopiedade, a pessoa sente prazer ao ficar lambendo as próprias feridas. Mas, agindo assim, você acaba afastando os outros, porque ninguém tem paciência. Além disso, agindo dessa forma, você se despotencializa. Nesse processo de vitimização, a coisa mais comum é sufocar seu potencial, se paralisando, e esse é o problema. É como a nostalgia: você deixa de viver o presente, que é onde sua vida acontece. O ansioso, que fica fugindo das coisas, também faz isso. Acho que a gente se sabota sim e que romper esse ciclo de tristeza e ansiedade é algo que só depende da gente. E isso é muito libertador, muito empoderador, mas, ao mesmo tempo, desesperador.

Como você rompeu esse ciclo?
Manter a cabeça no hoje é fundamental. Não são só as grandes conquistas que importam, senão a gente vai se sentir bem só duas vezes por ano: quando é promovido e quando nasce o nosso filho, por exemplo. A vida acontece minuto a minuto. Ignoramos muitos prazeres porque nos focamos numa meta lá no final. Eis o que o ansioso não percebe: o sucesso não é uma meta, é um processo. Estamos sempre em movimento e o êxito não é senão continuar caminhando com alegria, esperança e serenidade em direção a ele. O sucesso não é um patamar fixo a ser alcançado, mas um movimento diário, em que a única coisa garantida é a necessidade de continuar em movimento, andando – um passo de cada vez, um tombo hoje, uma vitória amanhã. Passar a me focar no presente foi uma mudança de comportamento que deu muito certo para mim. Viver o hoje, entender que a vida é um processo e ser leve… Se levar um pouco menos a sério, não se cobrar tanto a perfeição. Algumas pessoas já nascem mais ou menos com essa mentalidade, outras precisam desenvolver isso.

Você precisou desenvolver isso.
Sem dúvida. Tive um adolescência tristonha.  Adolescência, a época da faculdade… Toda essa fase de formação. Me sentir bem e me focar no presente não foram coisas que consegui resolver lá atrás. Sempre fui mais solene, pesado. Não conseguia ser leve. O ansioso, o depressivo tem tiranos dentro dele. Fui aprendendo com tempo. Em 2007, depois de muitos anos repletos de felicidades no trabalho, tive um insucesso e caí. Foi uma demissão abrupta que mexeu demais com a minha autoestima. De repente, eu, que vinha de uma fase em que estava me achando o máximo, me questionei: mas e aí, então eu não sou um sucesso? Meu processo de transformação de executivo para empreendedor foi um processo de voltar a acreditar em mim, no meu talento, nas minhas capacidades. Eu tinha 37 anos, mas não foi fácil. Minha musculatura interior estava tão fragilizada que levei dois anos para admitir que eu era um empresário, sendo que minha primeira empresa tinha começado a dar certo já no quarto, quinto mês. Eu já estava vivenciando outro sucesso e não conseguia saboreá-lo, tinha até mesmo vergonha de dizer que eu era empresário: esse é um exemplo claro de como nossa cabeça desvirtua os acontecimentos externos. A realidade é uma percepção.

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Você acredita que isso serve mesmo para situações extremas, quando a gente pensa nas tragédias do mundo, em quem passa fome, por exemplo?
Tem situações impossíveis de enxergar como boas. Não creio em polianismo. Não se trata de pintar de cor de rosa os dias sombrios. Mas existe sempre a questão de como nós reagimos àquilo que nos acontece. Gosto muito daquela frase do Sartre: “Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim”. A vida é sofrimento, é dor. Você vai ter que lidar com isso, com as frustrações, as perdas, as expectativas que não se confirmaram. É claro que existem tragédias enormes e tombos mais leves. Mas mesmo na pior das tragédias, você pode reagir de uma forma mais positiva. Assim como o mais leve dos tombos pode ser motivo de suicídio se você não lidar bem com isso. Dias horríveis, reafirmo, estão dentro da gente. Essa lente está dentro do nosso poder de ação. Você pode trocar suas lentes. Cada um do seu jeito. Mas não existe atalho ou almoço grátis. Acho que a gente sempre pode trabalhar nosso interior para alcançar mais equilíbrio e bem-estar. Cada um tem que se olhar no espelho, saber quem é e, ao se enxergar, operar mudanças de hábito. E mudar de hábito é difícil!

Para você, é possível uma pessoa passar dez, doze horas no escritório e ter qualidade de vida?
Com certeza: quando você está fazendo alguma coisa que faz sentido, que tem propósito, quando você sente que está cumprindo sua missão e tem mais prazer do que sofrimento. Já vivi situações em que ir para o trabalho era um horror. E já vivi o contrário, não querer que o dia acabe. O trabalho sempre apresentará desafios, mas, quando há mais recompensa do que dor, você não quer que o dia termine. O trabalho, que a gente coloca muitas vezes como fonte de frustração, também pode se transformar numa das nossas maiores fontes de realização. É um tremendo de um veneno quando te faz mal e uma vitamina quando te faz bem.

Você já foi de classe média baixa e hoje é de classe média alta. No livro, você escreve: “Vivemos num lugar onde não ter nada é garantia de discriminação e desprezo. E em que ter conseguido juntar alguma coisa é garantia de ser achacado, de ser odiado, de gerar desconfiança, mal-estar alheio e cobiça”.
Já tive vergonha da casa onde eu morava. Isso foi complicado na adolescência, aquele período em que você quer ou ser admirado ou então ser invisível – você não quer chamar atenção pelos motivos errados. É o momento em que você está formando sua autoimagem. Depois, veio a outra fase: comecei a sentir constrangimento por viver bem. O Brasil é isso: se você mora num lugar bom demais, se seu carro for bom demais, você é um alvo. Você sofre muito se não tem e se tem também. Além disso, se você mora bem e tem um bom carro, você é visto como um privilegiado, “elite branca”. Você se sente culpado por ter dado certo: é como se estivesse sempre devendo. Imagina: eu, que não sou herdeiro de nada, que tenho sobrenome “Silva”.

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Para quem você recomenda seu livro?
O primeiro volume, para os que vivem a vida executiva no seu dia a dia, têm chefes e subordinados, crachá, plano de saúde, vaga no estacionamento. O terceiro, que ainda será lançado, é para quem está trilhando um caminho por contra própria, em uma vida que tem outras dificuldades e outras alegrias. Este segundo livro é para todo mundo que tem que lidar com si mesmo. Se você nunca teve medo, ansiedade, estresse, então não é para você. Se já viveu isso em algum momento dentro ou fora do trabalho, o livro oferece confissões de um cara que viveu profundamente essas questões. 

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