Bruno Fagundes: ‘Tem de ser peguete mesmo. Já tenho duas relações sérias, o teatro e a novela’
Com dez anos de carreira, o ator faz seu primeiro papel em novela - e não teve moleza por ser filho de Antonio Fagundes
“Fiz teste para todas as produções recentes da Globo: Sangue Bom, Amor à Vida, Joia Rara… Não passei. Foi com muita felicidade que recebi a notícia de que interpretaria dr. Renato, em Meu Pedacinho de Chão“, disse no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo
Foto: Tomás Arthuzzi
Uma garrafa de champanhe Veuve Clicquot espocou na última semana de outubro passado em um apartamento dos Jardins, em São Paulo, onde moram Bruno Fagundes, 24 anos, e Mara Carvalho, 52. Filho e mãe, ambos atores, brindaram e se abraçaram efusivamente. Afinal, depois de dez anos de estudos e 11 peças de teatro, ele havia sido aprovado para sua primeira novela. A partir de 7 de abril, Bruno será apresentado aos telespectadores no papel de dr. Renato, um médico romântico e à frente do seu tempo, em Meu Pedacinho de Chão, próxima trama das 6 da Rede Globo. “Tenho o sobrenome forte de pai e de mãe. Mas a questão é que estou fazendo o meu trabalho. E vida de ator é difícil para todos. Tudo pode acontecer de uma hora para outra”, disse o rapaz, filho de Antonio Fagundes, 64.
Com naturalidade, Bruno conta que nos últimos anos foi testado e recusado em muitas produções da Rede Globo, como Sangue Bom, Joia Rara e Amor à Vida. Ele foi aprovado para Em Família, mas, para esse trabalho, precisaria largar Tribos, peça que encena em São Paulo até fim de abril, e não quis. “Achei nobre. Muitos atores ficariam na euforia de fazer TV, mas Bruno privilegiou o espetáculo que já estava em cartaz. Sempre disse a ele: ‘Na minha vida, por exemplo, ouvi mais ‘não’ do que ‘sim’. São poucos os atores que conseguem se firmar'”, conta Mara Carvalho.
Adolescência
Além das gravações da novela, Bruno protagoniza a peça encenada no Teatro Tuca, em São Paulo, apontada no ranking da revista Veja SP como um dos melhores espetáculos em cartaz na cidade nos últimos sete meses consecutivos. Foi Bruno quem teve a ideia de montar no Brasil o texto vencedor do New York Drama Critics em 2012 após vê-lo nos Estados Unidos. “Quando assisti pela primeira vez, tive medo de interpretar o Billy, porque é um personagem com uma carga emocional muito forte”, fala sobre o protagonista, um deficiente auditivo que tem uma relação familiar conturbada. Na época, ele encenava a peça Vermelho, protagonizada pelo pai dele e, juntos, decidiram também produzir e dividir o palco novamente para contar a história do jovem surdo. “Quando a gente começou a trabalhar juntos, não foi brincadeira de pai e filho, mas algo profissional. Tenho orgulho dos meus pais, amo os dois e não sofro com as cobranças, comparações, necom qualquer outro complexo edipiano”, diz Bruno rindo.
Bruno decidiu ser ator aos 13 anos e conta que quando começou a trabalhar com Antonio Fagundes “não foi brincadeira de pai e filho, mas algo profissional”
Foto: Tomás Arthuzzi
A decisão de ser ator veio cedo, aos 13 anos. “Certa manhã, ele chegou a meu quarto e me disse que havia definido que também seria ator. Achei até que demorou para tomar esse rumo, afinal, ele sempre acompanhou de perto o nosso trabalho”, diz Mara. Na época, ela e Antonio já estavam separados. “Eu tinha 11 anos quando meus pais terminaram o casamento. Mas não houve nada traumático. Não teve essa de juiz definir pela guarda compartilhada ou resolver disputas. Sempre estive próximo do meu pai”, conta o ator.
Decidido, Bruno começou a estudar: conciliou o colégio, com as aulas de teatro e piano. “Além das baladas. Ele virava a noite em festas e, mesmo assim, não faltava e ia bem nas provas”, completa a mãe. Ainda naquelas férias, Bruno decidiu fazer intercâmbio e partiu para Londres. “Meu pai sempre me falou sobre a importância de ter um inglês fluente, mas dizia que um ano fora era muito tempo. Eu quis passar um mês na Inglaterra. Os pais dos meus amigos ficaram furiosos com os meus. Disseram que eram loucos por deixar um garoto tão jovem sair sozinho do país. Mas meus pais já confiavam em mim”, conta o ator, que já pensou em largar o Brasil e ir morar no exterior. “Foi na época da faculdade. Passei as férias em Nova York e vi que os Estados Unidos funcionavam muito bem. Era tudo muito bom e eu não queria voltar. Mas aqui é meu lugar”, conta.
Plano B
Bruno fez vários cursos de teatro, canto, apresentou-se como cantor de MPB, rock, R&B em um show em 2011 no Café Paon, em São Paulo, porém, na hora de optar por uma faculdade, escolheu o curso de relações públicas. “Achei que precisava de um ‘plano B’. Vida de ator é instável”, ele diz. Até trabalhou alguns meses em uma agência especializada em mídias sociais. “Mas não era a minha. Queria atuar.”
Entre a decisão de ser ator na puberdade e o sucesso no teatro aliado à estreia em novelas aos 24 anos, Bruno confessa que passou por momentos angustiantes. “Antes de Vermelho, eu estava numa vontade louca de me mostrar, de me afirmar. Acabei me machucando. Fiz uma peça que não precisava. E ouvi muitos ‘nãos’. Sou muito rigoroso comigo, mas aprendi a contar até dez. Senão, acabaria doente”, ele conta.
Jovem em início de carreira, Bruno segue morando com a mãe. “Não tenho uma rebeldia, uma vontade louca de sair de casa. Independência não tem nada a ver com dinheiro ou morar sozinho, mas se apropriar do que faz. Sou independente”, diz o ator, que está solteiro, não sonha em casar ou formar uma família. “Sou muito novo para isso. Nem passa pela minha cabeça agora.” Bruno conta que já teve namoradas, viveu paixões arrebatadoras, descreve-se um romântico que gosta de mandar flores e fazer declarações de amor. “Mas não gosto de falar muito sobre isso. Fico tímido”, declara, desviando o olhar.
“Sou rigoroso comigo. Aprendi a contar até dez. Senão, acabaria doente”
Foto: Tomás Arthuzzi
Ele também cora ao falar da aparência. Foi um menino fofinho, um adolescente gordinho e, ao longo dos anos, transformou-se em um homem bonito. “Sério que acham isso? Tenho tendência a ganhar peso e, por causa da novela, fechei a boca, peguei pesado na malhação e perdi uns 8 quilos. Pela profissão, a gente faz tudo. Até pintar o cabelo de laranja!”, comenta rindo sobre o visual de dr. Renato.
E diz não se lembrar de nenhuma cantada recebida. Sozinho, sempre circulou tranquilo pelos lugares, sem atrair olhares. “Agora, com minha primeira novela, vou descobrir o que é o assédio, a pressão do público, das gravações…”
Em cada momento da conversa, todos os assuntos convergem para um mesmo tema: a felicidade do bom momento profissional. Em outubro passado, em entrevista a CONTIGO!, o pai dele declarou: “Tenho peguetes, mas prefiro namorar”. A resposta de Bruno? “Namorar é bom, mas agora não dá. Tem de ser ‘peguete’ mesmo. Já tenho duas relações sérias: o teatro e a novela. Se eu assumir uma terceira, seria infiel a uma delas. E sou um homem comprometido.”
Parceiro
Ainda menino, um dos programas mais divertidos para Bruno Fagundes era visitar o trabalho do pai. Aos 4 anos, ele conheceu o diretor Luiz Fernando Carvalho, 53, nos bastidores de Renascer, novela protagonizada por Antonio Fagundes. “Era ainda uma criança, mas já podia ver no avesso de seus olhos aquele ator sensível e dedicado que se tornou, mas que certamente não se encaixa nos padrões oficiais do galã”, diz o diretor de Meu Pedacinho de Chão. Ele conta que acompanha Bruno desde o seu début no teatro, em 2004, mas soube de sua maturação em cena, na peça Tribos, no ano passado, e enviou sua produtora de elenco para assisti-lo. O ator fez dois testes até levar o papel de dr. Renato na novela. “Bruno é bonito, carismático, bom ator, mas guarda um certo mistério. É mais introspectivo, sua riqueza é revelada aos poucos. Considerei que esse traço de sua personalidade tinha muito a oferecer a seu personagem”, descreve o diretor.
Antonio Fagundes também está na trama. “Quando fui chamado para a novela, Bruno já estava. Nós já contracenamos em algumas cenas. Ele é muito experiente. Fez muito teatro e nós acompanhamos o trabalho um do outro, assim como acompanho o dos meus amigos”, disse o pai na coletiva de imprensa de Meu Pedacinho de Chão.
Diretor de Tribos, Ulysses Cruz, 60, também elogia Bruno. “Além de todo o talento que o DNA privilegiado o dotou, ele tem um excelente caráter e é exemplo de jovem útil, generoso e amigo. É um rapaz adiante de seu tempo, porque criou para si uma estratégia para ser visto como um artista necessário e não somente como o filho do Fagundes, de quem tem muito orgulho e se espelha”, conta. Ulysses lembra ter se impressionado no início dos ensaios. “Eu pensava no enorme trabalho que teria. Mas, em nossa primeira leitura, Bruno demonstrou que já tinha feito esse trabalho antes dos ensaios. É o primeiro ator não surdo a fazer o papel e ser aceito por toda a comunidade surda.”
“Quando fui chamado para a novela, Bruno já estava. Nós acompanhamos o trabalho um do outro, assim como acompanho o dos meus amigos”, diz Antonio Fagundes, na foto com o filho em 2002, em São Paulo
Foto: Fabio Cordeiro