Enquanto eu me ouço, me arrependo do que falo
Sempre fui boa com as palavras e as usei muitas vezes de maneira irresponsável
Era assim. Eu tinha uma língua bélica. Chicotinho verbal. Sempre fui boa com as palavras e as usei muitas vezes de maneira irresponsável. Mirava um ponto fraco e cuspia fogo. Fazia pra doer. Sempre tive raiva de muita coisa.
Falta de oportunidade; burrice alheia; lentidão e até aquelas pessoas meio blasés que me olhavam enviesado. Para essas era metralhadora. Fazia questão de abundar em versos e prosas nada gentis. O fato, leitor, é que a maturidade tem me transformado. Tô estranha. Não quero mais briga. Dou um rim para permanecer calada. Um Rivotril se apoderou da minha boca e reajo em câmera lenta.
Pareço um leão marinho abobado em meio ao chopp nas mesas cariocas de bar. Acho que enchi. Combater, retrucar, impor, dá um trabalhão e quero economizar rugas. Finjo ser zen sem ser. Nem me reconheço. Deixo a pessoa esbravejar, arder na labareda da fala, estrebuchar até corar e mantenho a minha fleuma.
De vez em quando me dá até uma raivinha. Mas passa. Não quero mais bílis. Quero marshmallow. Hoje, nesse mundo tão irreal, cheio de camadas paralelas, uso meu avatar imaginário para existir. Um dia sou bruxa, outro fada. Mas, sobretudo, sou um novo “eu”. Uma Kika em construção para me suportar melhor e viver tudo em alta frequência do bom. Fiquei exigente e quando me ouço quero melodias. O trash ficou no passado. Que venham novos hits.