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Thomaz Saavedra releva a história do pôster desde seu nascimento

Thomaz Saavedra conta sobre o nascimento do pôster e o impacto dessa arte que até hoje atrai colecionadores em busca de obras originais e surpreendentes.

Por Por Thomaz Saavedra | Fotos Salvador Cordaro
Atualizado em 26 Maio 2022, 10h19 - Publicado em 10 jun 2014, 13h35
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Thomaz Saavedra é dono do antiquário que leva seu nome e comercializa pôsteres originais de diversos artistas gráficos.  (/)
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Se o século 19 foi a época em que a fotografia desafiou a pintura, no século 20 o embate central se deu entre a publicidade e o próprio conceito de arte. A partir de 1890, o público começava a se sofisticar, ávido por ideias e referências que transbordavam da elite para a população. Foi nessa década que uma febre varreu a Europa e as principais cidades da América. Surgia uma nova forma de fazer publicidade que revolucionaria o mundo das artes. Rapidamente, as lúgubres e cinzentas ruas do passado desapareceram. Dos bulevares parisienses às ruelas de Bruxelas e Amsterdã, das solenes praças de Londres às vitrines de Nova York, proliferavam imagens coloridas e exuberantes criadas por alguns dos mais talentosos artistas do período, extasiando uma população carente de beleza. O pôster já existia, apesar de destituído de cor e valor artístico, mas a arte da propaganda ainda não havia sido inventada. Para isso ocorrer, era necessária a intervenção de um artista excepcional e a colaboração de um litógrafo de talento, nada menos que um mestre das cores. O francês Jules Cheret (1836-1932) foi essas duas pessoas. Considerado o precursor do affiche (pôster de publicidade), guiou uma geração espetacular de artistas. Os grandes nomes de Paris, como Pierre Bonnard, Jean-Louis Forain, Henri de Toulouse-Lautrec, entre outros, lideraram essa revolução do design e em grande parte se inspiraram na estética das gravuras japonesas. As paredes dos edifícios e os muros de Paris nunca mais foram os mesmos ao serem adornados de obras de arte que passaram a compartilhar da mundanidade cotidiana. 

 

Os pôsteres eram frágeis, mas deslumbrantes – e uma nova forma de arte passava a ser reconhecida pelos colecionadores. Criaram-se exibições, clubes e publicações para debater sobre o assunto na Europa e nos Estados Unidos. Cada novo modelo era aguardado com fascínio. Um fascínio que hoje se faz presente nas grandes coleções de arte e design gráfico. O desenho de pôsteres atraiu um verdadeiro quem é quem do mundo das artes. Picasso, Matisse, Warhol, Hockney e Lichtenstein faziam parte desses inventivos criadores. No Brasil, Di Cavalcanti produziu affiches para companhias exportadoras de café. Nas mãos de mestres, o pôster se reinventou de diversas formas, mas poucas vezes com o brilhantismo do italiano Leonetto Cappiello (1875-1942). No auge da belle époque e do art nouveau, ele excitava a imaginação do público com desenhos de cores primárias, fundos contrastantes, personagens inesquecíveis – paradoxo de uma arte supostamente efêmera. Durante 40 anos, Cappiello criou cerca de mil imagens. Seu instinto o levou a usar o fenômeno de associação de imagens como ferramenta publicitária para atiçar o subconsciente. Um segundo designer merece destaque: A. M. Cassandre. Nos anos 1920, ele elaborou os mais inovadores pôsteres de sua geração. Seus trabalhos eram essencialmente art déco, mas sorviam todas as influências de sua época – de Picasso a Walt Disney. A tipografia usada era tão importante quanto o desenho. Nenhum elemento ficava fora do lugar. Cada linha, forma ou letra tinham função nos pôsteres de Cassandre. 

Na realidade, a maior parte do século 20 foi influenciada pela propaganda impressa, pelos affiches espalhados por vilas e cidades. Difícil traçar a história do período sem ressaltar seu poder de mobilização. O pôster serviu a todo tipo de produto e propósito. Ajudou a enaltecer tiranias, mas também a ridicularizá-las. Em momentos de guerra, trazia mensagens de esperança e propagava ideias que mudaram o comportamento da sociedade. Não surpreende que continue influente. Como não lembrar o pôster de Shepard Fairey para a primeira campanha de Barack Obama? Em um fundo azul e vermelho, destacava-se o semblante do então candidato e a palavra hope (esperança). E há ainda o tipo de pôster que passou a ser valorizadíssimo em coleções particulares, alcançando cifras estratosféricas: os de cinema. Se o original da versão do filme Frankenstein de 1931 (só se tem notícia de um exemplar, com 2 x 2 m) um dia for colocado à venda, chegará a vários milhões de dólares. O pôster de Metropolis, a célebre distopia de Fritz Lang, de 1927, pode valer hoje cerca de 2 milhões de dólares. Designers como Saul Bass (Um Corpo Que Cai) e Bill Gold (Dirty Harry) fizeram a história do cinema tanto quanto alguns diretores. Há colecionadores que buscam apenas obras desses designers, com preços que variam de 8 mil a 40 mil dólares. Assinado por Arthur Evans, o pôster de Blow-Up capturou de tal maneira o espírito da época, que é bem mais lembrado como referência do que a própria obra-prima do cineasta Michelangelo Antonioni. O fundo vermelho – alusão ao assassinato que ocorre na película –, a pose desafiadora dos protagonistas, tudo reflete o zeitgeist. O filme (e o pôster), de 1967, foi lançado um ano antes dos protestos que sacudiram Paris e prenunciavam uma revolução na moda e na atitude. Já o belíssimo trabalho de Georges Allard para o filme Orfeu Negro captura magistralmente o lirismo do autor da peça original, Orfeu da Conceição, de Vinicius de Moraes, com seu gingado de cores numa época em que a bossa nova existia bem mais na cabeça de Vinicius, João Gilberto e Tom Jobim do que como movimento musical. Um bom exemplo de pôster de cinema atiça nossa memória afetiva, estimula a boa conversa entre amigos, traz cores, cheiros e lembranças, como uma madeleine proustiana. E isso poucas obras de arte fazem.

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