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Juliana Borges é escritora, pisciana, antipunitivista, fã de Beyoncé, Miles Davis, Nina Simone e Rolling Stones. Quer ser antropóloga um dia. É autora do livro “Encarceramento em massa”, da Coleção Feminismos Plurais.
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Mulheres na política fazem a diferença também no combate à pandemia

Entre os países com os melhores resultados no enfrentamento ao novo coronavírus, a maioria é liderado por nós

Por Juliana Borges
Atualizado em 18 abr 2020, 21h43 - Publicado em 18 abr 2020, 21h43

Há anos que pesquisadores e organizações têm falado sobre a importância da participação das mulheres na política. O enfoque era, sobretudo, na importância do debate de agendas vistas como “femininas” na ordem do dia, tais como direitos sexuais e reprodutivos, violência de gênero, igualdade no mercado de trabalho. Essas agendas são centrais se tivermos um olhar minimamente sério sobre as desigualdades no mundo. É inegável que mulheres recebem menos exercendo as mesmas funções que homens nas empresas. Também é inegável as complicações de saúde e a alta mortalidade de mulheres decorrentes do fato de não termos nossa autonomia e direitos sexuais e reprodutivos respeitados. E também é inegável o assédio e o abuso na nossa sociedade – falamos da violência ontem, certo? Mas algo também inegável são os impactos na formulação de políticas públicas de modo mais amplo quando mulheres estão à frente de organismos e instituições governamentais. Duas áreas centrais são saúde e segurança. Primeiro, pelos pontos que eu já elenquei – direitos sexuais e reprodutivos, além do combate à violência –, mas também ao pensar nessas áreas em sua totalidade.

As mulheres são a imensa maioria de cuidadores pelo mundo. Para se ter ideia, representamos mais de 70% dos trabalhadores de saúde na linha de frente de combate à pandemia no mundo – no Brasil, a área de enfermagem, por exemplo, é composta por 85% de mulheres. Além disso, historicamente, somos as que cuidamos de nossas mães, pais, avós, além do planejamento e organização das famílias. E esse cuidado tem impacto em como pensamos segurança pública. Há anos, o Brasil chegou a iniciar uma política interessante de enfrentamento à violência contra homens jovens e negros nas periferias, com o programa Mulheres da Paz, no âmbito do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci).

De modo geral, esse programa tinha como eixo capacitar mulheres de comunidades periféricas para serem mediadoras e trabalhar no “resgate” de jovens em seus territórios. Um exemplo que virou referência para o país foi desenvolvido na cidade de Canoas, no Rio Grande do Sul. Entre 2009 e 2011, houve redução de mais de 70% no índice de homicídios no bairro Guajuviras da cidade, a partir de uma ação integrada que envolveu orientação e mediação comunitária para a solução de conflitos, investimento em uma comunicação cidadã, casas de juventude, centros de referência para mulheres em situação de violência e a atuação direta de mais de cem mulheres capacitadas em direitos humanos, agindo ofensivamente pela redução da violência.

A história da participação das mulheres na política é uma história de muita luta. Milhões de mulheres tiveram que ir às ruas para garantir o direito ao voto. No início do século 20, as principais mobilizações por melhores condições de trabalho eram iniciadas por mulheres – para confirmar, basta uma pesquisa rápida sobre as paralisações das indústrias têxteis, por exemplo. Até a revolução russa, independentemente da avaliação que se tenha sobre as consequências dela, foi iniciada por uma greve de mulheres russas por pão, terra e trabalho.

Na última semana, o nosso diferencial na política ficou evidente. Entre os países com os melhores resultados no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, a maioria é liderado por mulheres. Alemanha, Taiwan, Islândia, Noruega e Nova Zelândia, liderados por mulheres, têm apresentado políticas com resultados efetivos no combate ao novo coronavírus. Na Alemanha, a primeira-ministra Angela Merkel não se perdeu no negacionismo. Tão logo a pandemia se alastrava por toda a Europa, ela se pronunciou à nação, apresentando a seriedade pedida pelo momento. Além disso, estabeleceu o isolamento social e também a testagem massiva dos seus cidadãos. Apesar do alto número de casos, a Alemanha tem apresentado uma taxa de mortalidade muito abaixo (em torno de 1,6% dos casos confirmados) de outros países europeus – Espanha, Itália e Reino Unido têm cerca de 10% de mortalidade.

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Na Islândia, a primeira-ministra Katrín Jakobsdóttir está testando gratuitamente a população, além de ter estabelecido rastreamento total. Na Nova Zelândia, Jacinda Arden estabeleceu o confinamento muito antes, determinando auto isolamento quando o país ainda tinha um número muito baixo de casos, proibindo a entrada de estrangeiros e estabelecendo que neozelandeses que cheguem ao país fiquem em isolamento. E quem pensa que Arden está discutindo afrouxamento das restrições após o sucesso está enganado. Ela tem pensando em não só manter como ampliar para outras medidas.

Em Taiwan, a presidente Tsai Ing-wen estabeleceu mais de cem medidas ainda em janeiro, tão logo fora anunciado pela China a epidemia, até então concentrada em Wuhan. Como resultado, o país relatou, até agora, apenas seis mortes pela doença e ela ainda está enviando ajuda humanitária aos Estados Unidos, com uma remessa de mais de dez milhões de máscaras. Na Noruega, a primeira-ministra Erna Solberg utilizou da mídia para informar a população. De forma lúdica, fez uma coletiva de imprensa só com crianças para apresentar os riscos da doença, mas, ao mesmo tempo, acalmar a população e dar o recado: se todos seguissem as determinações, a crise seria devidamente enfrentada. Na Finlândia, Sanna Marin, a mais jovem chefe de Estado do mundo, está usando das redes sociais e o apoio de influenciadores para falar sobre a pandemia. Para isso, seu governo garante informações baseadas em fatos e na ciência para que os influenciadores, de qualquer idade, falem sobre as ações e medidas de contenção para enfrentar a crise.

Algumas pessoas têm tentado minimizar esses exemplos dizendo que o importante é eleger bons líderes. Eu não duvido disso. A questão de gênero é interseccional e sabemos que ele é um tema de interesse de toda a sociedade. Mas contra fatos não há argumentos – apesar de parecer que estamos em tempos de trevas (alô, baixa Idade Média, essa não fica só para vocês!), em que pessoas negam a ciência e os fatos. Eu escolho, ainda, a ciência e os fatos. Essas mulheres estão provando na prática, no cotidiano, como termos mulheres na política pode fazer toda a diferença e de como as nossas vivências podem ser centrais para construirmos um mundo em que todos e todas tenhamos respeito, direitos e dignidade.

Acompanhe o “Diário De Uma Quarentener”:

01/04 – A rotina do isolamento de Juliana Borges no “Diário De Uma Quarentener”

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02/04 – O manual de sobrevivência de uma quarentener

03/04 – Permita-se viver “o nada” na quarentena sem culpa

06/04 – O que a gente come tem algo a ver com as pandemias?

07/04 – As periferias e as mobilizações na pandemia

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08/04 – Um exemplo de despreparo em uma pandemia

09/04 – Como perder a noção do tempo sem esquecer a gravidade dos tempos

10/04 – Não é hora de afrouxarmos o distanciamento. Se você pode, fique em casa!

11/04 – 3 filmes para refletir sobre a pandemia da Covid-19

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12/04 – Nesta Páscoa, carrego muitas saudades. Hoje, minha mãe completaria 54 anos

13/04 – Obrigada, Moraes Moreira!

14/04- E aí, quais são as lives da semana?

15/04 – Como praticar autocuidado radical?

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16/04 – #TBT da saudade do mar 

17/04 – Precisamos falar sobre a pandemia e violência contra as mulheres

 

 

 

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