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Assim foi a minha primeira quimioterapia

Nossa colunista Ana Barbosa compartilha sua luta contra o câncer de mama e conta como foi o início do tratamento.

Por Ana Barbosa (colaborador)
Atualizado em 28 out 2016, 14h37 - Publicado em 13 out 2016, 16h49

Tantos desconfortos e, ainda assim, a sensação de estar melhorando. Quarenta dias de idas e vindas a médicos e hospitais, dores grandes e pequenas, remédios, noites sem dormir. Mas era possível olhar no espelho e ver com meus próprios olhos a razão disso tudo, meu peito retalhado e inchado. E, quando tudo parecia voltar ao normal, começa a tão temida quimioterapia. Desde a primeira consulta com o oncologista, meu receio só fez aumentar. Ao ouvi-lo falar, crescem a angústia e a incerteza. Tantos tratamentos agressivos por causa de quê? Um tumor que já foi removido, a perspectiva remota de que haja uma recidiva. Pode muito bem ser que a doença nunca volte.

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Peço para adiar o início do tratamento. Não deve haver problema, imagino. Doce ilusão. Levo uma bronca daquelas. “Não negocio com terrorista”, é a resposta. Fico imaginando quem é o tão temido terrorista, eu? A doença? O tumor? Quer saber, acho que o terrorista é ele, que, com fatos e números, fica me apavorando. Me convence e a toda a família. Quem sou eu para ir contra as palavras de alguém tão sábio e conhecedor dessa doença maldita. Levanto a questão com meu marido: “Como assim, não fazer o tratamento?”.  “O tumor foi extirpado, meus gânglios estavam limpos, a doença não existe mais”, respondo. “Mas há sempre o risco de voltar.”, retruca. Eu continuo:  “É um risco remoto, tenho certeza que não voltará.”. Ele diz: “Não dá para arriscar. E se? O que a gente faz?” 

E lá vou eu para o matadouro.

Primeira coisa é o exame de sangue. Será que meu organismo está apto a receber essas drogas? Sã, me sentindo bem, deito na cama do hospital e deixo que me furem. A enfermeira se veste como se estivesse lidando com veneno: máscara, luvas, capa impermeável. Não era pra me curar? Pelo jeito, esse remédio vai matar a doença e tudo mais que está à sua volta. Posso sentir o líquido entrando, gelado a princípio, depois imperceptível. Um gosto estranho preenche meu peito, é a primeira vez, ainda não reconheço o gosto que vai me assombrar durante os próximos meses. Serei capaz de senti-lo onde estiver, em sonhos e pensamentos, provocando arrepios e medo. Acabou. Vou para casa achando que há certo exagero quando falam dos efeitos da quimioterapia. Sinto-me bem e sigo com meus afazeres normais. Dia seguinte acordo mais cansada, e sou obrigada a me deitar após o almoço. Acho que é a primeira vez na vida. Meu estômago começa a se manifestar e mostrar que existe, fica difícil comer.

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O terceiro dia é o pior. Mal consigo levantar, dominada pelo cansaço, forte e brutal, que brota dentro de mim. Parece que uma névoa envolve meu cérebro. Incapaz de me concentrar, não consigo ler ou acompanhar um filme mais complexo, durmo onde estiver. Um sono que não descansa, não recupera, pois, descubro, estou intoxicada e é preciso que a droga que circula em minhas veias acabe.Depois de uma semana já melhorei bastante, mas outros incômodos surgem. As unhas arroxeadas, a boca inflamada, a garganta que dói, dificuldade para engolir e escovar os dentes são constantes. Qual uma geladeira ou aparelho de ar condicionado quebrado, meu termostato está completamente desregulado. Sinto frio, sinto calor, tudo ao mesmo tempo. Café quente queima, alimentos ácidos ardem, e o gosto do remédio me acompanhando todas as horas. Não na boca ou na garganta, e sim dentro de mim, no coração. Pergunto-me se algum dia conseguirei esquecer esse gosto.

Mas, estes são os dias bons… Por isso, não perco tempo com besteira e aproveito os dias que me restam na companhia da família e dos amigos queridos que estão sempre ao meu lado. Sei que meu prazo de validade logo vai vencer. No 15º dia a farra acaba e volto ao ponto de partida.

 

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