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“Uma viagem romântica de bicicleta em Portugal”

Suor, terra, vento, sol e chuva. A editora de livros Luciana Pinsky mostra, a seguir, que para ela e o marido, Thomás Coutinho, esses são os principais ingredientes de uma escapada romântica

Por Redação CLAUDIA
Atualizado em 28 out 2016, 09h20 - Publicado em 26 jun 2016, 07h08

Luvas. Calça colada no corpo, sapatilhas, dois pares de meias – um por cima e outro por baixo da calça. Camiseta de manga curta, camiseta de manga comprida, segunda pele e capa de chuva com capuz. Boné e capacete. Óculos escuros, na chuva e no sol. Com algumas variações, esse foi o uniforme com o qual percorri mais de 350 quilômetros, pedalando, na região do Alentejo, em Portugal. Se não lhe parece o mais romântico figurino para a primeira viagem à Europa com o marido, está enganada.

A bicicleta me acompanha desde pequena. Lembro o exato dia em que aprendi a andar sem rodinhas, no quintal de casa. Da primeira trilha, aos 12 anos. Ela se tornou o meu meio de transporte para ir à escola, à faculdade e, hoje, ao trabalho. E meu instrumento de lazer nos passeios pela cidade, nas trilhas e, finalmente, cicloviagens. Portanto, quando Thomás, meu marido, propôs passar uma semana pedalando, vibrei. Seria minha primeira cicloviagem desde o nascimento dos nossos filhos, hoje com 2 e 5 anos. E a primeira da vida dele. Depois de alguma pesquisa, optamos por Por­tugal, o destino europeu menos frio em março, quando poderíamos viajar. Mes­mo assim, faz frio. O Alentejo é um lugar repleto de pequenas cidades, às vezes minúsculas, com seus castelos e fortificações.

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Chove, chuva

Do aeroporto, em Lisboa, seguimos até o município de Marvão em uma van que já tinha nosso equipamento, todo alugado: bicicleta, GPS (o roteiro estava lá) e material de segurança, além de bolsas de guidão impermeáveis, essenciais para carregar máquina fotográfica, lanches e roupa extra.

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O primeiro dia seria o mais tranquilo, com apenas 48 quilômetros até a cidadezinha de Crato. Seria. Sentimos o vento gelado logo ao deixar Marvão em uma convidativa descida. Desviamos um pouco da rota para percorrer uma estradinha de terra – nós gostamos bastante de pedalar em terreno rústico. Encontramos muros de pedras, ovelhas e oliveiras: tudo muito bucólico. De volta à estrada, paramos em Castelo de Vide, onde nos esquentamos com chá quente. Estávamos prontos para voltar a pedalar quando os pingos ligeiros de antes fizeram-se chuva de verdade. E foi no frio e debaixo d’água que pedalamos os 28 quilômetros seguintes até Crato. No início, a capa protegia e os pés estavam secos. Ao final, toda molhada, sentia a boca gelada, quase paralisada. Ao chegar ao hotel, no início da tarde, fui direto para o banho quente. Em seguida, como não estava chovendo, pudemos conhecer o belo e minúsculo lugarejo e conversar com alguns dos simpáticos habitantes que aproveitavam os tímidos raios de sol em cadeiras na calçada.

O segundo dia nos reservava um desafio muito maior: 68 quilômetros até Estremoz. A previsão era de chuva, que caiu uma hora depois do início da rota. Eu estava a ponto de desistir – não por cansaço, mas pelo desconforto. Seria difícil, porém, parar para esperar o resgate; era melhor continuar pedalando para que o corpo não esfriasse demais. Por causa do tempo, deixamos de conhecer lugares bonitos, como Alter do Chão, por onde passamos rapidamente. Com boa parte do percurso para trás, a chuva deu uma trégua e pudemos aproveitar mais a paisagem. Quando estávamos perto de Estremoz, paramos na Quinta da Esperança, uma fazenda, o que nos deu forças para finalizar o percurso. Dormimos no alto da cidade murada e recuperamos a energia à base de ‘enchidos’ (embutidos) e pães saborosíssimos.

Em cicloviagens, o que cansa é percorrer muitos quilômetros em pouco tempo. Ou seja, nem dá para o corpo se recuperar e você já está pedalando novamente. O terceiro dia, nesse sentido, era preocupante: tínhamos 81 quilômetros pela frente. O destino agora era Monsaraz. Frio sem chuva, descobri, é uma delícia para pedalar. As subidas se tornam menos árduas, e o corpo não fica pingando sem parar. Pegamos várias estradinhas escondidas, onde praticamente não se viam carros. E presenciamos a explosão de cores das flores da primavera. Ao chegar ao hotel, o cansaço não era nada comparado à alegria de poder, de fato, curtir o percurso. Para comemorar, jantamos muito bem. Como era época de borrego (o mesmo que cordeiro), havia muitas variedades da iguaria. Thomás preferiu ‘porco preto’. O dia seguinte seria cheio. Além de conhecer a cidade, os planos incluíam uma volta pelo Lago Alqueva e uma visita ao Castelo de Mourão. Pedalamos cerca de 67 quilômetros em um clima delicioso e partimos para Évora, desta vez em uma van (o caminho era um estradão sem fim, gostoso de carro, mas não tão legal de bicicleta).

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Finalmente, relaxar

Diferentemente das paradas anteriores, Évora é uma cidade bem povoada. Como estávamos na Páscoa, havia muitos turistas dentro e fora dos muros que cercam a cidade antiga. Ficamos na parte interna, em um hotel moderno ao lado do aqueduto. Uma mistura de história e modernidade. Era o último pouso da viagem. Pedalaríamos por mais dois dias, mas sempre voltando a Évora. Talvez as paisagens não tenham sido as mais surpreendentes. Mas, com o tempo ensolarado, tudo parecia mais bonito. E tínhamos a sensação de vitória por termos enfrentado a adversidade climática.

Assim, no quinto dia de viagem, conhecemos os Cro­meleques dos Almendres, conjunto de quase uma centena de pedras que remonta ao neolítico. O local tem seu fascínio, mas o que eu mais gostei naquele dia foi do trajeto: finalmente pegamos uma boa trilha de terra. Com subida na ida e uma animada descida na volta. Eu já estava plenamente acostumada com a bicicleta de rodas maiores (aro 29), mais estável). Meti o pé. Ultrapassávamos os cautelosos carros, que fugiam dos buracos.

No sexto e último dia, a ideia era pegar a Ecopista. É um caminho para pedalar ou andar construído sobre um antigo trilho de trem. Foram pouco mais de 55 quilômetros, muitas flores, folhas, terra e até um pequeno túnel, onde pedalamos no escuro. E assim terminou nossa experiência em Portugal. Com os perrengues, sentimos a cumplicidade aumentar. Foi muito legal apresentar para o Thomás algo de que eu gosto tanto. E ver quanto ele aproveitou, se envolveu. A bicicleta permite curtir cada detalhe, perceber a mudança sutil da vegetação, conversar com os moradores, parar no meio do nada e, ainda, sentir o silêncio. O silêncio de que tanto carecemos.”

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